Exclusivo para Assinantes
Economia

Segundo turno: misto de otimismo e cautela no mercado financeiro

Setor produtivo, por sua vez, está em compasso de espera e cobra de ambos os candidatos clareza nas propostas
Jair Bolsonaro e Fernando Haddad vão disputar o segundo turno Foto: Paulo Whitaker/Nacho Doce/File Photos / REUTERS
Jair Bolsonaro e Fernando Haddad vão disputar o segundo turno Foto: Paulo Whitaker/Nacho Doce/File Photos / REUTERS

RIO - A disputa entre Jair Bolsonaro (PSL) e Fernando Haddad (PT) no segundo turno é vista com um misto de otimismo e cautela no mercado financeiro. Para alguns analistas, a distância entre os dois candidatos — Bolsonaro obteve 46,06% dos votos válidos e Haddad, 29,24% — indica que há chance de vitória do ex-capitão do Exército no fim de outubro. Outros afirmam que “o jogo só acaba quando termina” e que, embora haja tendência de alta na Bolsa no curto prazo, divergências entre um eventual futuro presidente do PSL e seu principal assessor financeiro, Paulo Guedes, bem como dificuldades de articulação no Congresso para aprovar reformas trazem incertezas no médio e longo prazos.

O setor produtivo, por sua vez, está em compasso de espera e cobra de ambos os candidatos clareza nas propostas que considera fundamentais para atração de investimentos e geração de emprego, como reforma da previdência e reforma tributária. Para representantes da indústria e economistas, esses pontos estão nebulosos nos planos e discursos de Bolsonaro e Haddad e dificilmente, dizem, serão esclarecidos na próxima fase de campanha, uma vez que são medidas impopulares.

Paulo Petrassi, gestor de renda fixa da Leme Investimentos, frisa que Bolsonaro obteve mais votos que os dois principais partidos de esquerda (PT e PDT) e que candidatos de destaque do PT ao Senado, como Eduardo Suplicy (SP) e Lindbergh Farias (RJ), não se elegeram. Isso será interpretado positivamente pelo mercado, afirma, pois o setor financeiro tem receios quanto a uma nova gestão petista, vista como mais resistente às reformas. Nos últimos dias, a Bolsa disparou com as pesquisas de intenção de voto que indicavam distância maior entre Bolsonato e Haddad.

— A diferença foi grande, então, isso deve neutralizar alguma frustração dos investidores que contavam com a vitória no primeiro turno. Mas o jogo só acaba quando termina — pondera Arnaldo Curvello, sócio diretor da Ativa Investimentos.

Analistas preveem dólar abaixo até de R$ 3,70 numa eventual vitória de Bolsonaro no segundo turno e acima de R$ 5,50 caso Haddad ganhe — na última sexta-feira, a moeda fechou em R$ 3,854. Para Juliano Ferreira, estrategista da BGC Liquidez, o mercado tende a reagir bem ao resultado das urnas de ontem, mas, num segundo momento, vai “olhar com lupa” o novo governo, com atenção especial para composição de ministérios, bancada parlamentar e primeiros projetos. Aí reside a fragilidade de ambos os candidatos, segundo economistas:

— O programa (de Bolsonaro) fala em aumentar a arrecadação sem explicar como. Haddad diz que vai fazer reforma, com idade mínima, mas não dá detalhes. A vantagem (de um segundo turno) seria ter uma interlocução entre o governo atual e o que vai entrar, para aprovação de medidas que já estão na boca, que tornariam mais fácil o início do próximo governo — avalia Luis Otávio Leal, economista-chefe do banco ABC .

José Velloso, presidente executivo da Abimaq, que reúne empresas do setor de máquinas e bens de capital, se queixa da falta de clareza das propostas. A prioridade, na sua opinião, é equacionar o desequilíbrio fiscal, o que está ligado a uma reforma da Previdência. Além disso, diz, é necessário implementar uma agenda de competitividade, o que exigiria tanto reforma tributária como abertura comercial, além da redução de juros para os clientes que estão na ponta, empresas e consumidores.

Velloso avalia que não está claro como os candidatos poderão desconcentrar o setor bancário e forçar o juros para baixo. O PT, por exemplo, sugere que o banco que ofereça juro menor pague menos imposto, uma medida que o representante da Abimaq acredita ser de difícil execução. Ele avalia ainda que a privatização de bancos públicos, como sugere Paulo Guedes, não necessariamente fomentaria a competição no setor.

— A reforma tributária é outra incógnita. Aumentar ou reduzir alíquota não é reforma. O sistema tributário continuará complexo — afirma Velloso.

Para Sergio Vale, economista-chefe da MB Associados, os dois candidatos terão dificuldade de “fazer diferença”, devido a restrições de articulação no Congresso:

— A agenda do PT é velha, e, mesmo que o Haddad quisesse fazer diferença, há uma dificuldade no partido, no Congresso. O Bolsonaro não é muito diferente do Haddad nesse ponto. Tenho dificuldade em imaginar que ele vai manter uma agenda de reformas tão intensa como o Paulo Guedes tenta colocar. Acho que vai acabar sendo um pouco mais de continuidade da agenda do Temer, mais do que grandes inovações.